sexta-feira, 4 de março de 2011

Capitalismo - sistema económico desumano

Para compreendermos a tese defendida pelo marxismo de que o capitalismo é um sistema económico desumano, temos de partir da concepção de natureza humana que Marx teorizou.
Para Marx, o que nos torna humanos e nos distingue dos outros animais não é a razão, como pretendem os filósofos - Aristóteles definia o homem como animal racional - nem tão pouco a capacidade de produzir cultura; o que nos afastou da animalidade foi a capacidade para produzirmos os nossos próprios meios de subsistência, por outras palavras, foi o trabalho, pelo qual transformamos a natureza em objecto de fruição; o trabalho é assim fonte de humanização.
Na economia capitalista, o trabalho bem como as matérias-primas, instalações, máquinas, estrutura organizacional, constituem as forças de produção; estas, juntamente com o modo de produção, geram a super-estrutura (sistema jurídico, organização política, cultura). Ora o modo como a produção é organizada sob o sistema capitalista provoca a alienação do trabalhador e consequentemente a sua desumanização.
O modo de produção capitalista implica de um lado os empregadores e do outro os trabalhadores; os primeiros têm o monopólio dos meios de produção: matérias-primas, máquinas, instalações, domínio dos sistemas de comercialização e de comunicação. O trabalhador só conta com a sua força de trabalho. Este modo de produção supõe relações de produção que tem implícita uma natureza explorativa já que os empregadores têm todas as condições para explorarem os trabalhadores e obviamente não vão perder essa oportunidade. Assim, para além de ser um sistema de relações de produção, o capitalismo é concomitantemente um sistema de relações de poder e é um sistema extremamente assimétrico porque o poder do empregador é muito superior ao poder do trabalhador, completamente inoperante sem os outros meios de produção, e é esta assimetria de poder que transforma o contrato livremente assumido entre o empregador e o trabalhador numa verdadeira ficção porque a «liberdade» do trabalhador acaba por ser entre aceitar o contrato ou ficar sem trabalho
O paradigma da economia capitalista é a troca, ou, como hoje se diz, o mercado. Tudo tem valor de troca e é redutível a esse valor de troca. O trabalho tem valor de troca e, mediante contrato, o trabalhador coloca a sua força de trabalho ao serviço do empregador, em troca de um salário. Mas entre o que o empregador paga ao trabalhador, acrescido das despesas com os meios de produção, e o produto, tal como é vendido, há uma mais-valia de que o empregador se apropria.
Para além de o trabalhador não possuir alternativa real, há ainda outra razão que o condiciona a aceitar pacificamente a situação e essa prende-se com a ideologia capitalista que leva os trabalhadores e os empregadores a verem tudo sob o prisma da troca, aquilo a que Marx chama o fetichismo da mercadoria, a partir daí o trabalhador acha muito natural receber um salário que não corresponde ao que ele efectivamente produziu porque tudo está sujeito às leis da troca e do mercado e a troca e o mercado são livres, ninguém coage fisicamente ninguém. Quando um trabalhador acredita que é tão livre para entrar num contrato lesivo para os seus interesses como o é o empregador, sofre daquilo a que Marx chama falsa consciência e essa falsa consciência leva-o a acreditar que vive no melhor dos mundos possíveis e que nada vale a pena fazer para mudar a situação porque aquela em que vive é a única possível.
Mas, para além deste aspecto de exploração material que o sistema capitalista permite, há outro que tem a ver com uma forma de exploração numa outra camada mais profunda da personalidade humana e aqui entra o conceito marxista de alienação. A alienação é uma experiencia de estranhamento e de desintegração, de falta de unidade do «eu».
No trabalhador, integrado no sistema capitalista, a alienação reveste as seguintes formas: em primeiro lugar o trabalhador é alienado do produto do seu trabalho, porque não participa minimamente no processo decisório, funciona como mais uma máquina programada para produzir determinado produto. Há estranhamento entre o trabalhador e o produto do seu trabalho.
Em segundo lugar o trabalhador é alienado dele próprio porque, como não participa como ser humano no processo de planificação e de decisão, encara o trabalho como um fardo e só espera que finde a jornada  para então ser ele próprio; o trabalho em vez de o humanizar é fonte de desumanização.
Em terceiro lugar, o trabalhador é alienado da comunidade em que trabalha porque a lógica do sistema obriga-o a ver os outros como competidores numa luta implacável por promoções e prémios; a relação com os outros, ao invés de ser de cooperação é de competição.
Em resumo, um sistema económico em que o modo de produção implica exploração económica e psicológica, em que o trabalho, ao invés de ser meio de realização humana, é fonte de desumanização, não pode estar ao serviço dos seres humanos, o capitalismo revela assim a sua face desumana.

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