sexta-feira, 22 de abril de 2011

Para um novo pensamento econômico

segunda-feira, 18 de abril de 2011

A opressão como injustiça social

Iris Young em Five Faces of Oppression defende a necessidade de se desenvolver um conceito de justiça que vá além da referência a uma justiça distributiva e que inclua também a referência às condições institucionais necessárias para o desenvolvimento e exercício das capacidades do indivíduo. Nesse mais amplo conceito de justiça haveria lugar para tratar a opressão como uma forma injustiça porque as pessoas oprimidas «sofrem de alguma inibição da sua aptidão para desenvolverem e exercitarem as suas capacidades e expressarem as suas necessidades, pensamento e sentimentos.» (p. 175)

Fomos habituad@s a encarar a opressão como o exercício da tirania de um grupo dominante contra outros grupos existentes na sociedade, assim por exemplo se referia o apartheid, o colonialismo ou mesmo o comunismo, como regimes tirânicos e consequentemente opressores. Esta perspetiva tinha a «vantagem» de subtrair as sociedades democráticas, nas quais existe igualdade perante a lei e liberdade individual de escolha, à ignominia da opressão, nestas sociedades não haveria opressão. Mas Iris Young recentra  e mostra como a questão não é assim tão simples:

«A opressão designa a desvantagem e a injustiça que certas pessoas sofrem, não por causa de um poder tirânico que as constrange, mas por causa das práticas do quotidiano de uma sociedade liberal bem-intencionada.» p. 176

De fato, nas sociedades liberais, politicamente democráticas, há grupos sociais que são sistematicamente oprimidos, mas não se identifica objetivamente qualquer grupo dominante opressor, isto é, não se identifica um grupo que consciente e intencionalmente tenha como objetivo oprimir outros grupos. O que não quer dizer que esse grupo não exista e não lucre e tire vantagem com a opressão de outro ou outros grupos, tendo, portanto, interesse na perpetuação do sistema. E isto acontece porque a opressão reproduz-se sistematicamente nas instituições económicas, políticas e culturais e não é preciso fazer nada, basta deixar correr e não intervir. Tudo se passa como se a opressão estivesse inscrita na matriz do funcionamento social, fosse estrutural ao funcionamento da sociedade, fosse parte da sociedade.

A opressão assume, segundo Iris Young, cinco faces que podem ou não coexistir num grupo oprimido, bastando, todavia, que uma se manifeste para podermos falar de opressão. São elas: exploração, marginalização, ausência de poder, imperialismo cultural e violência.

(1) A exploração significa que o grupo oprimido é de alguma maneira espoliado da sua energia em benefício do grupo opressor. Esta categoria foi desenvolvida por Marx que explicou como na sociedade capitalista, embora deixasse de haver classes sociais institucionalizadas, se manteve a estrutura classista da sociedade pelo fato dos donos dos meios de produção se apropriarem da mais- valia produzida pela força de trabalho dos trabalhadores. O argumento é o de que os trabalhadores contratam livremente com os empregadores e aceitam voluntariamente os salários estabelecidos, mão havendo formalmente mecanismos coercitivos, mas de fato não é preciso haver, basta a assimetria das relações de poder para termos a injustiça normalizada e dissimulada sob a capa do acordo e consequentemente de justiça. Como Iris Young refere:

«A injustiça da sociedade capitalista reside no fato de alguns exercerem as suas capacidades sob o controlo, de acordo com os objectivos e em benefício de outros.» p. 186

Da exploração resulta assim a injusta, porque profundamente desigual, distribuição de bens.

(2) A marginalização implica grupos de pessoas não integradas socialmente, de uma maneira geral, grupos sociais afastados do sistema de trabalho; essas pessoas são impedidas assim de desenvolverem e exercitarem as suas aptidões e são injustamente limitadas nas suas interações.

(3) A falta de poder significa o afastamento sistemático de grupos sociais do acesso à participação na tomada de decisõese de deliberação. Essa carência revela-se sob a forma de ausência de autoridade, baixo estatuto e auto-imagem pobre.

(4) O imperialismo cultural significa que a cultura dominante numa dada sociedade também é opressiva porque tende a apresentar-se como universal e a impor-se a grupos sociais que são «obrigados» a aceitá-la ou a sentirem-se anormais porque não se enquadram no padrão estabelecido, e assim as pessoas que integram esses grupos são impedidas de se exprimirem e de se afirmarem.

(5) A violência dirigida a membros de determinado grupo social pelo simples fato de pertencerem a esse grupo - violência sistémica - é também uma das faces da opressão, provavelmente a mais visível. Por exemplo, a violação, enquanto violência sexual, aterroriza todas as mulheres e limita a sua liberdade de movimentos. A violência dirigida contra homossexuais é igualmente limitativa da sua liberdade de expressão e de afirmação. A violência dirigida contra negros pelo facto de serem negros é igualmente lesiva dos interesses deste grupo social, o mesmo se passando com imigrantes, ciganos, etc.

Nem todos os grupos sociais oprimidos conhecem as mesmas «faces» da opressão, as combinações podem variar, mas a presença de qualquer uma destas faces é suficiente para falarmos em opressão e consequentemente em injustiça social.