sábado, 24 de outubro de 2015

MERCADOS FINANCEIROS E DEMOCRACIA


Numa entrevista recente concedida à revista IHU On-line, o economista Andrea Fumagalli explica como os mercados financeiros estão longe de ser democráticos e como podem mesmo ditar a morte da democracia.

Quanto à sua composição, os mercados financeiros, embora contenham um número imenso e incontável de investidores, funcionam como uma pirâmide que tem no vértice 'os tubarões' - um pequeno número que controla 65/ do fluxo total de capitais.
Quanto ao modus operandi, é essa minoria que determina a dinâmica e a orientação do mercado e toma decisões que afetam a vida das pessoas.

Sobre o modo como essas decisões afetam as nossas vidas, todos conhecemos direta ou indiretamente experiências negativas relacionadas com juros e com dívida pública e privada; no fundo essa foi a maneira que a oligarquia que controla os mercados encontrou para transferir riqueza dos pobres para o ricos. Por exemplo, em relação à dívida pública, o que acontece é que os que têm mais recursos em vez de pagarem impostos para subsidiarem serviços sociais, de segurança, transportes ou vias de comunicação, de que também beneficiam direta ou indiretamente, emprestam dinheiro ao próprio Estado, e depois obrigam-no a tirar 'à força' aos que poucos recursos têm, para além da sua capacidade de trabalho, para pagar o empréstimo e para, como maviosamente dizem, custear o 'serviço da dívida'. É assim que ocorre aquilo a que os economistas (alguns) chamam de transferência de rendimento do trabalho para o capital. E é também assim que se está a matar a democracia e a lançar o descrédito sobre os políticos do regime.

Aqui vai o texto, abreviado e adaptado de AndreFumagalli:

O pensamento neoliberal fundamenta-se no conceito de neutralidade da moeda e na suposição da perfeita competição nos mercados financeiros. Na verdade, os mercados financeiros não são imparciais e neutros, mas expressão de uma hierarquia bem precisa: longe de serem concorrenciais, escondem uma pirâmide que vê, na parte superior, poucos operadores financeiros controlando mais de 65% de fluxos globais e, na base, uma miríade de pequenos investidores e operadores desempenhando uma função passiva. Tal estrutura permite que poucas empresas tenham capacidade de atingir e afetar a dinâmica do mercado. As agências de rating (amiúde em conluio com as financeiras) ratificam, de modo instrumental, decisões oligárquicas, tomadas de tempos em tempos.
Com tal farsa, o pensamento neoliberal tenta fazer passar como objetiva, neutra e naturalmente dada, uma estrutura de poder que, ao contrário, objetiva favorecer uma distribuição que vai dos mais pobres para os mais ricos. (...)
No mesmo momento em que as hierarquias do mercado ditarem as escolhas da política económica, e o próprio mercado estabelecer as regras das relações humano-sociais, a democracia, entendida como processo de decisão resultante de um princípio dialético, está morta.
(…) A desconfiança da "política" surge no exato momento em que ela se torna uma caixa vazia, que ratifica decisões tomadas em outros lugares. É consequência, não causa, da prevalência do poder económico sobre o poder político e sobre o direito.”


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